sexta-feira, 13 de março de 2009

Kassab e o milagre da multiplicação das vagas

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Um verdadeiro milagre aconteceu em São Paulo, devidamente noticiado hoje. A prefeitura conseguiu, sem precisar construir creches para isso, diminuir de metade o número de crianças.

Ninguém tinha pensado antes e porem, a ideia e simples e luminosa: reduzir a lista das crianças cadastradas.

Em dois meses de “recadastramento” as 110 mil crianças que aguardavam vagas viraram 60 mil. 50 mil a menos em dois meses.

Kassab poderia agora prosseguir e propor que as que ficaram no novo cadastro preencham agora um novo formulário, a ser assinado pelos pais com comprovante de DNA ou simplesmente assinado pela própria criança. O prazo da resposta poderia ser reduzido, ate atingirmos a promessa feita por Kassab na campanha eleitoral de zerar o número de crianças fora das creches.

Agora falando sério, será que o Ministério Público vá engolir calado? As entidades da sociedade cívil ficarão sem reagir? os vereadores aceitarão calados? a mídia vai aceitar a nova lista sem ir atrás?

Reproduzo a seguir alguns elementos para ajudar a entender o que está em jogo e a gravidade do que está acontecendo com as crianças e as mães à procura de uma vaga em creche. 


Luis Favre


Assistente leva filha para fábrica por falta de opção

Jéssika Torrezan do Agora

Há mais de cinco meses esperando uma vaga, a assistente de serviços gerais Odeilma Silva Costa pode perder o emprego porque não consegue colocar em uma creche a filha, Maria Clara, de um ano. Como não tem com quem deixar a menina, ela vai junto todos os dias para a fábrica de calhas onde a mãe trabalha.

A patroa já disse que Odeilma não poderá mais levar a filha ao local, que tem máquinas que podem machucar a criança. “A patroa até escreveu carta pedindo urgência, mas não adiantou. Tenho quatro filhos para sustentar.”

Foi oferecida uma vaga em outra escola, que, segundo Odeilma, é muito longe. “Se tiver que levá-la lá, perco o emprego do mesmo jeito.”

Daiana de Oliveira também não consegue vaga para o filho, Guilherme, um ano, e para a sobrinha Verônica, oito meses. Ela tem a ajuda da mãe, Roseli Silva, para cuidar das crianças. Roseli, que tem câncer, já cancelou exames porque não tinha onde deixar os netos. Daiana passou por outro imprevisto: um mês depois de ter feito o cadastro, ela voltou à creche e disseram que os nomes não estavam lá. “Tivemos de fazer um novo.”

A prefeitura diz que Odeilma recusou uma vaga e terá de aguardar até ter lugar na unidade que ela quer. Sobre Daiana, o governo diz que as crianças continuam no mesmo lugar na lista. Não há um prazo para que as crianças sejam atendidas.

 

53 mil somem de fila por creche

Queda ocorreu após recadastramento, afirma a Prefeitura. Houve duplicidade de pedidos

FÁBIO MAZZITELLI, JT

fabio.mazzitelli@grupoestado.com.br

Em apenas quatro meses de recadastramento, a Prefeitura de São Paulo eliminou da lista de espera por creches municipais 52 mil crianças, número equivalente aos 53 mil alunos de 0 a 3 anos atendidos por novas vagas de 2005 a 2008, na gestão conjunta de José Serra e Gilberto Kassab.

Com a revisão da demanda, anunciada ontem pelo próprio prefeito Kassab, o novo déficit oficial de vagas em creches é de 57.607. Aguardam por matrícula em pré-escola outras 14.585 crianças, totalizando a falta de 72.192 vagas na educação infantil.

Os novos números começaram a ser colhidos em setembro e têm como referência dezembro de 2008. O dado anterior era de junho e apontava déficit de 158 mil vagas, sendo 110 mil em creches e 48 mil em pré-escolas. O novo cadastro retirou da lista de espera cerca de 86 mil crianças de 0 a 6 anos, cujas famílias não confirmaram o interesse pelas vagas.

A revisão do déficit foi feita via correio e custou cerca de R$ 200 mil. As famílias cadastradas receberam uma carta registrada no endereço comunicado à Secretaria Municipal de Educação. Elas tinham que preencher a ficha de cadastro enviada com a correspondência e devolvê-la em uma caixa dos Correios, sem custo.

De acordo com o secretário de Educação, Alexandre Alves Schneider, o recadastramento foi preciso porque foram constatados muitos casos de duplicidade de nomes (o mesmo aluno foi cadastrado mais de uma vez). Havia também de 1.500 a 2.000 crianças que moram fora da cidade e pediam vagas no município.

Durante o processo, segundo Schneider, houve muitos casos de famílias não localizadas - mas o secretário não informou o número de famílias que saíram do cadastro porque a carta voltou.

“Veja, se a mãe não foi achada pelo correio, ela também não teria sido achada pela escola. A gente contratou os Correios porque talvez seja a instituição que mais consiga chegar aos cidadãos do País. Resolvemos fazer o recadastramento porque o cadastro não era adequado. Cada hora tinha um número diferente (de demanda) e o sistema não era confiável ”, afirma Alexandre Schneider.

Para o secretário, a redução do déficit não foi apoiada somente no recadastramento, mas também no aumento no número de vagas. De 2005 a 2008, foram construídas 51 novas creches, 56 pré-escolas e firmados 351 convênios com particulares. Atualmente, a rede municipal tem 113 mil matrículas de crianças de 0 a 3 anos. Em 2004, no final da gestão da ex-prefeita Marta Suplicy, eram 60 mil matrículas nessa faixa etária.

“Os números melhoraram e vamos nos esforçar para zerar a fila, mas já baixou bastante”, comemora o prefeito Gilberto Kassab.

Desde 2006, por pressão do Ministério Público, a Secretaria de Educação informava a demanda da educação de três em três meses, o que foi interrompido para o recadastramento, que coincidiu com as eleições do ano passado. A Promotoria ajuizou cerca de 15 ações contra a Prefeitura pleiteando vagas para 4 mil crianças.

“A mãe precisa dar o endereço correto e, eventualmente, o telefone correto porque senão a gente não consegue, mesmo tendo a vaga, achá-la. Ou porque telefone ou endereço estão errados ou, obviamente, porque as pessoas se mudam”, diz o secretário.

Para se candidatar a uma vaga em creche ou pré-escola, os pais da criança precisam procurar uma escola da Prefeitura mais próxima de sua casa. O atendimento é feito por ordem de chegada.

NÚMEROS

158 MIL era o déficit em creches e pré-escolas em junho de 2008

72 MIL é a fila da espera na educação infantil após recadastramento

53 MIL é o número de vagas criadas pela Prefeitura de 2005 a 2008

ENTENDA O CASO

JUNHO DE 2008 a Secretaria Municipal de Educação divulga um déficit de 110.091 vagas em creches e 47.946 em pré-escolas

SETEMBRO DE 2008 em meio à campanha eleitoral, a secretaria anuncia um recadastramento, via correio, das famílias com interesse nas vagas.

NOVEMBRO DE 2008 o prazo para as famílias responderem termina e a secretaria passa a fazer o balanço do déficit

FEVEREIRO DE 2009 sem avanço nas negociações com a Prefeitura para abertura de novas vagas, a Promotoria da Infância e da Juventude começa a ajuizar ações para garantir vagas na educação infantil a quem procura os conselheiros tutelares da cidade. No total, cerca de 15 ações são ajuizadas, pleiteando vagas em creches para cerca de 4.000 crianças. A Justiça aceita o pedido da Promotoria em pelo menos um dos casos

MARÇO DE 2009 a Secretaria Municipal de Educação divulga a demanda após o recadastramento. O déficit cai para 57.607 nas creches e 14.585 nas pré-escolas

Oposição questiona lista de espera das creches

Gabriela Gasparin e Jorge Soufen Jr - AGORA

A bancada de oposição da Câmara de São Paulo já prepara tática para colocar em xeque os novos dados divulgados por Gilberto Kassab (DEM) sobre a fila de espera em creches e pré-escolas.

“O levantamento precisa de acompanhamento da sociedade e do Ministério Público”, disse Antonio Donato (PT), que defende um levantamento independente. “Boa parte das cartas [do recadastramento] nem chegam às favelas.”

“Vamos pedir para o secretário se explicar”, disse Alfredinho (PT), da Comissão de Educação da Câmara.

A coordenadora do curso de psicopedagogia da PUC (Pontifícia Universidade Católica), Neide Noffs, afirma que falta planejamento da prefeitura ao criar vagas em creches -que não são geradas, necessariamente, nos locais onde há mais crianças nascidas.

Ela cita a Espanha, que, para evitar a falta de vagas, cadastra as crianças assim que nascem. “São Paulo não está preparada para tanta procura. A cidade tem o problema, mas não a prevenção.”

Noffs diz que a situação se agrava na periferia, onde as mães não têm o costume de procurar por vagas com antecedência. “Em um bairro pobre, não dá para garantir que todos se cadastrem. A população só procura a vaga quando vê que a creche está pronta. Não há processo de conscientização de cadastro.”

Para Cisele Ortiz, coordenadora do Instituto Avisa Lá (entidade voltada à formação continuada de educadores), o sistema de cadastro de demandas não é eficiente. “Enquanto não houver um sistema confiável, nunca vamos ter certeza nenhuma. Infelizmente, falta transparência e acesso público aos dados.”

O secretário municipal da Educação, Alexandre Schneider, disse que o recadastramento é eficiente. “Os Correios tiveram dificuldades em menos de 10% dos endereços.”

Schneider disse que há transparência na administração Kassab e alfinetou a gestão da ex-prefeita Marta Suplicy (2001-2004), do PT. “Em 2004, não só não eram divulgados [dados]. A prefeitura nem sabia a demanda.”

Cida Perez, secretária municipal da Educação entre 2003 e 2004, disse que a gestão de Marta trabalhou para organizar o sistema e dar qualidade a ele. “A gente criou as condições para a divulgação dos dados”, afirmou.

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Fonte: Blog do Favre

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