por Luiz Carlos Azenha
Mais uma vez a mídia corporativa brasileira tentou desgastar o governo brasileiro com uma crise inventada. Mais uma vez, se deu mal:
"Condenamos os atos de intimidação contra a embaixada brasileira e exigimos que o governo de fato de Honduras pare de acossá-la", afirmou à mídia a embaixadora dos Estados Unidos ante a ONU, Susan Rice, cujo país preside a instância neste mês.
O comunicado atende ao pedido do chanceler brasileiro, para quem a embaixada permanece "virtualmente sitiada".
Diante do Conselho de Segurança da ONU, Amorim classificou de "acossamento" os cortes de luz e energia realizados na segunda-feira na embaixada e a restrição à circulação que é garantida por integrantes das forças de segurança hondurenhas e pelos próprios toques de recolher impostos no país.
O chanceler denunciou que as ações constituem uma clara violação da Convenção de Viena e pediu ao Conselho de Segurança da ONU "condenação expressa" para evitar qualquer um ato hostil. Pelo 22º artigo da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961, locais de missões diplomáticas (embaixadas e os edifícios anexos) são invioláveis, e agentes do Estado acreditado (que recebe a embaixada) não podem entrar sem consentimento do chefe.
Logo que o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, chegou à embaixada --de surpresa, segundo as autoridades brasileiras--, o prédio teve água e energia elétrica cortadas. Horas mais tarde, os serviços foram restabelecidos. Os telefones, porém, permanecem cortados. Desde aquele dia, o prédio está cercado por militares, e todas as manifestações pró-Zelaya foram impedidas de se aproximar.
Nesta quinta-feira, em entrevista à Folha Online, o diplomata brasileiro Francisco Catunda Rezende comemorou a entrega, por equipes da ONU, de comida, se roupas e de materiais de limpeza e higiene pessoal. "Estou com a barba por tirar desde segunda-feira. Vou tomar um banho decente com sabonete, vou me enxugar com toalha e não com papel como estava fazendo. Já é um grande progresso", disse.
Dentro da embaixada permanecem Zelaya, a família dele e cerca de 70 apoiadores, além dos funcionários da missão diplomática brasileira. O grupo diz que o governo interino anti-Zelaya, além de racionar a entrega de alimentos e de outros materiais, faz barulhos à noite, em uma aparente tentativa de levá-los à exaustão.
Na sessão com o Conselho de Segurança da ONU, o brasileiro Amorim disse acreditar que um "diálogo político" é o início da solução para a crise no país, mas que não sabe "qual vai ser o resultado". O chanceler aproveitou ainda para dizer que o governo brasileiro não teve influência na viagem de Zelaya até Tegucigalpa, que é ilegal por haver ordens de prisão emitidas contra o presidente deposto.
"Intromissão"
Nesta quinta-feira, o governo interino liderado por Roberto Micheletti afirmou que houve uma "evidente intromissão" do Brasil "nos assuntos internos" do país na acolhida de Zelaya e que, por isso, está responsável não só pela segurança do hondurenho como pela de todas as pessoas e propriedades que estiverem envolvidas no caso.
O comunicado da Secretaria de Relações Exteriores de Honduras possui tom grave e conclui que ocorreu a intromissão apenas com base em uma declaração de Zelaya na qual ele afirma ter "consultado" o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e o chanceler, Celso Amorim, sobre a sua viagem. Para o governo interino, isso prova que a entrada ilegal de Zelaya em Honduras foi "um ato promovido e consentido pelo governo do Brasil".
Essa conclusão do governo interino de Honduras contraria as declarações das autoridades do Brasil e do próprio Zelaya do episódio.
Zelaya está na embaixada brasileira desde segunda-feira (21), quando retornou a Honduras em busca, segundo ele, de "diálogo direto" para resolver a crise causada por sua deposição, em 28 de junho passado.
Histórico
Zelaya voltou a Honduras quase três meses depois de ser expulso. Nas primeiras horas do dia 28 de junho, dia em que pretendia realizar uma consulta popular sobre mudanças constitucionais que havia sido considerada ilegal pela Justiça, ele foi detido por militares, com apoio da Suprema Corte e do Congresso, sob a alegação de que visava a infringir a Constituição ao tentar passar por cima da cláusula pétrea que impede reeleições no país.
O presidente deposto, cujo mandato termina no início do próximo ano, nega que pretendesse continuar no poder e se apoia na rejeição internacional ao que é amplamente considerado um golpe de Estado -- e no auxílio financeiro, político e logístico do presidente venezuelano, Hugo Chávez -- para desafiar a autoridade do presidente interino e retomar o poder.
Isolado internacionalmente, o presidente interino resiste à pressão externa para que Zelaya seja restituído e governa um país aparentemente dividido em relação à destituição, mas com uma elite política e militar --além da cúpula da Igreja Católica-- unida em torno da interpretação de que houve uma sucessão legítima de poder e de que a Presidência será passada de Micheletti apenas ao presidente eleito em novembro. As eleições estavam marcadas antes da deposição, e nem o presidente interino nem o deposto são candidatos.
Mas o retorno de Zelaya aumentou a pressão internacional sobre o governo interino, alimentou uma onda de protestos que desafiaram um toque de recolher nacional e fez da crise hondurenha um dos temas da Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), reunida em Nova York esta semana. A ONU suspendeu um acordo de cooperação com o tribunal eleitoral hondurenho e a OEA planeja a viagem de uma delegação diplomática a Honduras para tentar negociar uma saída para o impasse.
Pelo menos duas pessoas morreram em manifestações de simpatizantes de Zelaya reprimidas pelas forças de segurança durante um toque de recolher que foi suspenso nesta manhã. Nesta quinta-feira, houve novas marchas em favor do presidente deposto, mas também manifestações favoráveis ao governo interino.
Com France Presse e Reuters
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