sábado, 29 de novembro de 2008

Lula subestima a direita

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Não deveria me surpreender com as tentativas que começam a surgir, aqui e acolá, de responsabilizar Lula pelo desastre em Santa Catarina. Não tem sido diferente em tudo de ruim que vem acontecendo nos últimos anos. A constatação de problemas históricos do país gera críticas de que o presidente não os resolveu todos em quase seis anos de governo.

 

Desastres naturais ou causados pelo homem, desastres do tipo que geram comoção nas sociedades e que em qualquer país civilizado são tratados com consternação e união entre compatriotas, por aqui servem para luta política, para os inimigos do líder político do país tentarem desmoralizá-lo.

 

São críticas ainda difusas e que relutaram em botar a cabeça para fora da toca devido ao absurdo que encerram de quererem responsabilizar pela tragédia em Santa Catarina a esfera de governo mais distante das questões regionais, ou seja, o governo federal.

 

As críticas começam aludindo a “todos” os níveis de governo, mas logo se voltam contra quem “interessa”. Dizem que “não havia mapeamento das áreas de risco”, que a ajuda do governo federal seria “insuficiente” e, finalmente, revelam seu objetivo ao criticarem Lula por ter demorado a visitar essas áreas e por ter ficado pouco tempo na região.

 

Não haveria nada que Lula fizesse sobre essa tragédia – ou em qualquer outra questão – que seria considerado suficiente ou apropriado. Todos os problemas históricos e não-resolvidos do país servem, potencialmente, para atacar o presidente, pois é ele o grande entrave à vitória de José Serra na eleição presidencial de 2010.

 

Teme-se que o candidato indicado por Lula à própria sucessão torne-se imbatível se a popularidade do presidente estiver tão alta daqui a dois anos, pois sabem que São Paulo não é o Brasil e que o apoio que Lula tem hoje no conjunto do país bastaria para ele fazer seu sucessor. Então, não há trégua. Se esse novo ataque irá colar ou não, pouco importa. Atacar é preciso.

 

Irá funcionar? Depende do que se pretende como resultado. Penso que a população brasileira, em sua maior parte, já está meio vacinada contra a tentativa evidente de debitar na conta de Lula qualquer tragédia que aconteça. Contudo, a crítica ficará sempre lá, inscrita nos anais do jornalismo e pronta para ser usada num momento mais propício.

 

Não é de hoje que me recuso a subestimar o poder da mídia. Sei que a impotência diante de sua capacidade de pautar e direcionar o debate público gera em quem enxerga o que ela faz uma espécie de fé mística em que a safadeza não pode triunfar e em que ninguém é tão burro que não enxerga como transformam tudo em motivo para malhar o presidente da República, mas esse é um comportamento que, em certa medida, beira o auto-engano.

 

Há um plano muito esperto em execução no Brasil e na América Latina. O bombardeio incessante contra os líderes progressistas em todo continente deverá perder bastante com a eleição de Barack Obama. Penso que o apoio dos EUA ao golpismo de direita latino-americano deverá ser retirado. Mas o fato de os americanos pararem de fomentar tentativas de ruptura institucional nos países de seu quintal não impedirá as elites locais de continuarem a agir.

 

A grande fragilidade dos países latino-americanos que têm governos progressistas é a de que o que sustenta esses governos são líderes carismáticos que, em alguns anos, deixarão o poder. A grande dúvida é sobre se esses líderes conseguirão fazer com que os processos que desencadearam em seus países prossigam sob sucessores indicados por eles e por seus grupos políticos.

 

Quem sucederá a Lula, a Hugo Chávez ou a Evo Morales? Hoje, ele se confundem com o próprio processo que desencadearam. E seus inimigos políticos vão se travestindo em continuadores de suas obras, só que com “maior competência”, ainda que a aceitação dessa estratégia pelas populações-alvo não tenha sido testada.

 

Em outros países latino-americanos extra-Brasil, porém, os líderes acossados pelas coalizões midiáticas de direita optaram por falar às sociedades. Criaram televisões e rádios e contestam cada ataque que recebem dos meios de comunicação controlados por seus inimigos políticos.

 

Aqui, no entanto, a coisa é bem diferente. A maioria dos brasileiros não conhece o outro lado da moeda de quase todas as grandes acusações da mídia a Lula. Apesar de intuir que todos esses ataques têm alguma coisa que “não bate” e, por isso, continuar apoiando o presidente, essa maioria não sabe o que de fato se passou no caso do mensalão, do “causaéreo”, da febre amarela, do dossiê, da inflação, da crise econômica...

 

O sucesso em manipular a sociedade no caso da crise econômica está sendo tão grande quanto o de alarmar as pessoas no caso da febre amarela. Parte dos problemas na economia deve-se ao medo que a mídia incutiu nas pessoas ao estimulá-las a parar de consumir dizendo que iriam perder seus empregos, apesar de Lula vir dizendo o contrário (timidamente) e de os indicadores econômicos mostrarem que o presidente está certo.

 

O efeito é relativo, claro. Não se pode parar uma máquina gigantesca como o Brasil só porque se quer. Mas estejam certos de que se não tivesse havido estímulo da mídia à paralisação do consumo e dos negócios, o país poderia estar muito melhor.

 

Diante disso, quero reiterar opinião que venho formando nos últimos anos e da qual recuei ou avancei algumas vezes.

 

Penso que Lula – e só ele – deveria reagir. Neste momento, ele deveria mandar um recado claro à sociedade de que tem gente torcendo pela crise e de que os avisos da mídia para que as pessoas parem de consumir poderá prejudicar o país. Além disso, deveria comentar todas as acusações falsas de que foi alvo nos últimos anos – inclusive essa de Santa Catarina – e dizer que a mídia está com seus adversários.

 

É o que fazem Hugo Chávez, Rafael Correa, Evo Morales e até o casal Kirschner. Nos EUA, Barack Obama está propondo medidas para desconcentrar a propriedade dos meios de comunicação. Em parte nenhuma do mundo um governo se deixa espancar pelos adversários como faz o governo Lula.

 

Apesar de ter como contabilizar êxitos em várias áreas, é na política que pairam mais sombras sobre a estratégia lulista. Parafraseando o presidente Lula, quero dizer que estou convencido de que nunca antes neste país uma eventual vitória da direita foi tão perigosa e nunca antes essa corrente política contou com tanto poder para materializar seus desígnios.


Escrito por Eduardo Guimarães

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